Aconteceu na quarta-feira, dia 29 de agosto, às 10h30min, no Auditório do Campus Niterói, a Mesa de Debate com o tema “Cota Racial: desafio entre a história e a prática”. O evento foi promovido pelo Jornal da escola, o Correio CP2, um projeto de iniciação artística e cultural existente no colégio desde 2015, que conta com a participação de alunos bolsistas.
A Mesa foi composta pelos prestigiados convidados:
- Oséias Casanova, Artista Plástico renomado, autor das obras da exposição atualmente à mostra no Campus Niterói, a PERSPECTIVESE;
- Osmar Filho, Professor de Português do CPII – Campus Humaitá II e Coordenador do NEABI – Núcleo de estudos Afro-brasileiros e Indígenas do CPII;
- Ruy Cerqueira, Advogado, Assessor Jurídico da Educafro e
- Evandro da Conceição, Jornalista e Roteirista, atual estudante de mestrado na ECO – UFRJ.
O evento teve a participação dos alunos do Campus Niterói, docentes e outros servidores, contando ainda com a presença dos professores do Campus Karina Nascimento e Renata Lopes – coordenadoras do Jornal Correio Cp2 – e Marcos Fiuza, da equipe de Português, e ainda da professora Sara Dantas, da equipe de Inglês.
O Artista Plástico Oséias Casanova, ao visitar a exposição de suas obras no Campus, PERSPECTIVESE, disse: "A arte é a marca que o ser humano consegue deixar de existência numa vida. "É a evidência de que alguém existiu. Se alguém faz um caixote de feira, isso é arte - isso em se falando de arte num sentido mais amplo". Ao abrir a Mesa de Debate, Oséias, professor de Desenho, se apresentou profissionalmente, dizendo trabalhar com arte há cerca de vinte anos, tendo como áreas de atuação o desenho, a escultura e a pintura. Defendeu que o princípio de toda e qualquer relação é o respeito. Porém, vive-se numa sociedade que tem um histórico de escravização e desrespeito cujas consequências se vêem até hoje. Casanova também mencionou que a ideia de inferioridade do negro foi, de certa forma, “implantada” na cabeça das pessoas, e essa ideia veio crescendo, gerando resultados negativos. Então, como partir para uma solução, para um processo de desarticulação desses sentimentos negativos tão arraigados na sociedade? Ele diz que, quando se fala de racismo, de preconceito, as pessoas precisam entender quais ferramentas elas possuem que as impulsionam para adotar esse tipo de ação. Acrescentou que, infelizmente, é natural as pessoas muitas vezes não conseguirem desarticular determinadas ideias que lhes são impostas pela sociedade.
Oséias relatou que seu projeto, que retrata personalidades negras, como Mestre Pastinha, Machado de Assis, Solano Trindade, Malcom X, e outras, exalta o valor de cada uma delas. "Mas não falar enquanto negros, mas enquanto verdade. E a verdade vem de uma forma consensual. A gente expõe uma situação, apresenta pessoas que morreram lutando por igualdade, como Rosa Parks, Martin Luther King, e vamos falar sobre isso. Essa exposição, PERSPECTIVESE, nasceu disso, de colocar essas ideias num lugar onde se consiga falar sobre, onde se consiga discutir de igual para igual, um com o outro”, completa. Casanova ainda comentou que iniciou nas artes após ter sofrido um acidente com a mão direita, o qual restringiu seus movimentos e que, apesar de não desenhar bem na época, gostava muito da atividade. “Comecei a fazer isso depois de adulto. A minha arte hoje trabalha com a questão da cor de pele porque eu acho que isso tem dado muito certo. Eu não tenho resolvido a cabeça das pessoas, mas tenho trazido questionamentos. Essa mesa de debate, que está acontecendo, é uma coisa muito gratificante para mim porque vai haver a oportunidade de vocês falarem, e vai haver a oportunidade das pessoas daqui responderem e isso, no mínimo, irá aumentar os questionamentos de vocês”, finaliza.
Osmar Filho focou nas Ações Afirmativas. Comentou que o racismo atinge, com o mesmo vetor de destruição, tanto a negros quanto a índios e a pardos. Em seguida, falou sobre o NEABI - CPII, o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas, que está ligado à Pró-Reitoria de Pós-graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura do Colégio Pedro II (PROPGPEC), e tem como finalidade promover a produção e a disseminação do conhecimento por meio do ensino, da pesquisa e da extensão, no desenvolvimento de políticas de diversidade étnico-racial, que visa a estimular a igualdade e valorização das populações de origem africana e indígena.
Osmar traçou um histórico das políticas de ações afirmativas no Brasil. Ele citou que a política de cotas foi a primeira política pública realizada depois da Lei Áurea para atender a população negra, após mais de 300 anos de escravidão. Ele também mencionou que, desde 2004, existe ação afirmativa no Colégio, só que essa ação funcionava da seguinte forma: 50% das vagas do concurso para novos alunos eram destinadas para ampla concorrência e os outros 50% para estudantes oriundos de escolas públicas; e acreditava-se que as vagas para quem era oriundo de escolas públicas contemplariam pessoas negras imediatamente, o que não foi verdade durante algum tempo. Só a partir de 2012, desses 50% de vagas, 20% foram reservadas para pretos, pardos e indígenas. “Até então as próprias cotas não funcionavam racialmente de modo vertical, como deveriam ser. Acredito que hoje – hoje eu vejo muito mais alunos negros no Colégio do que antes – isso funcione de modo melhor”, comenta.
Ruy Cerqueira focou a questão da política afirmativa sob a perspectiva do Direito, mencionando que o conceito da política afirmativa ainda está bastante atrelado à questão racial e afirmando que a ideologia da cultura afirmativa vai além dessa questão. Ruy também explicou que o estado sempre teve mecanismos de políticas afirmativas, adotando historicamente essas intervenções, seja no âmbito social, econômico ou educacional.
Evandro da Conceição disse ser, ele próprio, prova da política bem-sucedida de cotas que, contudo, ainda vem sendo ajustada. É jornalista formado pela Universidade Estácio de Sá, entrou pelo ProUni como cotista, fez Pós-Graduação como bolsista em uma universidade privada, e atualmente faz mestrado na Escola de Comunicação da UFRJ integrando, efetivamente, a primeira turma do programa de cotas. Evandro disse que a política de cotas fez toda diferença na sua vida desde a graduação e é capaz remodelar todo o projeto de sociedade pelo viés da representatividade. Evandro afirmou também que hoje já existe toda uma geração de profissionais formados dentro da política de cotas e que, em consequência disso, ascendem socialmente, havendo, portanto, toda uma conjuntura social que se movimenta nesse sentido. Ele também comentou que em um relatório da ANCINE no final de 2016 ficou constatado que, no Brasil, na área de cinema, havia perto de "zero" roteiristas negros e "zero" mulheres diretoras negras. Isso começou a mudar um pouco em 2017, quando a TV Globo, inclusive, deu um certo suporte. Ele ressalta que esses dados devem ser um incentivo para uma mudança. Diz que, para ele, é importante trafegar nessa linha de narrativa negra porque, muitas vezes, se o diretor ou diretora não rubricar que aquele ator ou atriz será negro(a), isso não acontecerá.
“É importante salientar que a política de cotas, inicialmente, se dá dentro do ambiente universitário, do ambiente educacional, porque é a educação que muda, que abala todas as estruturas e eleva a gente para outro patamar, mas também é importante que essa representatividade se dê em outros lugares. Escrevi um artigo recentemente onde eu sugiro, inclusive para as emissoras de televisão que, mesmo que elas não façam as cotas por uma questão política, que façam por uma questão mercadológica, porque há todo um forte público consumidor envolvido. A gente só promove justiça social pelo viés da inclusão. Enquanto todos não forem incluídos, sobretudo a população negra – a mais privada de seus direitos por uma questão histórica e social – não será possível pensar numa sociedade justa e igualitária”, finaliza Evandro da Conceição.
Após todos os convidados se pronunciarem, a Mesa foi aberta a perguntas e foi dado início ao debate.
Clique AQUI para conferir a matéria no site do CP2.
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Confira abaixo algumas fotos do evento (clique na foto para ampliá-la):
Professora Karina Nascimento fazendo uma breve introdução antes dos convidados iniciarem suas falas. |
O artista plástico Oséias Casanova em um momento de fala. |
Osmar Filho, Professor de Português do Campus Humaitá II e Coordenador do NEABI. |
Ruy Cerqueira, advogado e assessor jurídico da Educafro. |
Evandro da Conceição, jornalista e roteirista, mestrando da ECO - UFRJ. |
Fala da professora Sara Dantas. |
Direção de Culturas/PROPGPEC