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sexta-feira, 16 de março de 2012

UNIFORME E IDENTIDADE ESCOLAR

Uniforme do CPII no século XIX.
      As lembranças de minhas melhores e piores vivências escolares, hoje interpretadas por mim como educadora, se vestem de blusa em algodão branco e saia de pregas em casimira cinzenta - o uniforme de minha escola.
      À parte as críticas que lhe dedicava, o fato é que essa roupa pertencia só a mim e a meus colegas, diferente daquela usada no cotidiano familiar, identificava-se com meu mundo social, sem meus familiares.
      Talvez por isso aprendi a usar o ferro ao passar a minha saia de pregas, com pano úmido para não ter lustro, ninguém o fazia como eu, nem minha mãe, prestimosa passadeira portuguesa.
      Depois de toda a manhã a fazer as muitas lições, realizava a "sessão passar a ferro".
Uniforme passadinho, vestia-o e a partir daí, nem sempre feliz, às vezes bem angustiada, pertencia à comunidade do Colégio Estadual São Paulo, era uma estudante.
      Como tal, com roupagem branca e cinzenta como a de meus iguais, tão diferentes entre si, construí ao longo dos anos meu eu intelectual e social. Tínhamos a roupa semelhante e também os mesmos direitos e deveres, mas a certeza da diferença.
      Vivíamos, entre acordos e conflitos, a verdadeira diversidade - havia os ricos, os de classe média, os pobres, os cristãos, os judeus, os muçulmanos, os brancos, os mulatos, os negros...
Prática coletiva, o uniforme garantia identidade de aluno, e nos unia para aprender. Como lei para todos, nos ajudou a conviver no ambiente escolar protegendo-nos de certas tensões decorrentes de embaraços causados pela forma de vestir.
      Hoje, décadas depois, o contexto educacional é bem diverso, mas o uniforme ainda confere identidade escolar, diferente da familiar. Nossos alunos estão segregados em escolas de ricos, pobres, remediados, intelectuais, empresários... Mas uniformizados são todos estudantes. Para os menos abastados excluídos de tantos espaços sócio culturais, uniforme é a oportunidade positiva de inclusão.
      Para os mais abonados é a possibilidade de renunciar a desejos de consumo supérfluo e de se identificar com seus iguais por meio de valores coletivos escolares e não pelas roupas de marca comercial que não atendem necessidades educativas.
      Ao exigir a prática de uniforme a seus alunos, em qualquer época, a escola expressa seu valor em"relação à vestimenta. Manifesta a responsabilidade, que lhe é devida, de propiciar o uso de vestimentas adequadas à saúde, ao convívio social e às atividades didáticas. Ao defender roupa de aluno a escola volta-se para seus princípios. Realiza, necessariamente, uma ruptura com o mundo externo por não atender a possibilidades, preferências e caprichos individuais. Evidentemente, não se trata de esconder personalidade e história de cada um sob vestimenta, mas possibilitar que se expressem num espaço público. Ambiente regrado pelo o que é bom para todos e não pela lei de cada um, pode assegurar convívio mais efetivo com a diversidade.
      Uniforme é cuidado da escola com todos. Uniforme representa para crianças e jovens a cultura escolar. Uniforme simboliza o direito de todos a uma educação igualitária para a vida pública.
Maria Manuela de Castro Mendes Leal Anabuki